quarta-feira, 19 de junho de 2013

A Bandeira

- Foda-se essa merda toda, então!
E pegou a bandeira, saindo violentamente porta afora.
Chegando na rua, bandeira em punho elevada sobre a cabeça, marchou firmemente entre os carros. Não, não tente entender o que ele estava fazendo. Apenas aceite o fato. Pé ante pé marchava pela faixa central da avenida.
É claro que um homem andando decidido exibindo imponente estandarte chama atenção. E, contra os carros, três pessoas começaram a seguir o marchante. É claro que três pessoas seguindo decididas um homem exibindo imponente estandarte chamam atenção. E mais alguns uniram-se ao grupo.
Não era algo homogêneo, mas a estranheza acabou atraindo mais e mais pessoas: 'tanta gente diferente unida por um único ideal deve ser algo que vale a pena seguir'. Sim, agora havia um ideal. Ninguém sabia direito qual era, mas devia haver. Qual outro motivo para aquilo? Aos novatos era explicado os porquês de marcharem. Logo eram os ex-novatos a fazerem os mesmo aos novos.
Em pouco tempo tantas pessoas seguiam a bandeira que a avenida já tinha seu trânsito paralisado. E mais, e mais. E mais gente se unia ao grupo buscando mudanças, melhorias e todas as outras coisas que aquele grupo deveria estar buscando.
Quando o número dos marchantes chegava à casa dos milhares e a bandeira tremulava mais forte que nunca, a avenida chegou ao fim. O primeiro a cair foi aquele primeiro a marchar. A multidão caiu em seguida. Um atrás do outro caiam como se não percebessem o abismo que havia a sua frente. Ninguém parava diante da beira do penhasco. Sim, o mundo acabava ali. Isso desvalorizava um pouco os prédios naquela região. E ali, ao fim da avenida e do mundo abria-se o abismo. Para baixo somente a escuridão sem fundo. Era ali que caiam os marchantes. Caíram e caíram.
Lá embaixo, se forçassem bem os olhos, ainda podiam ver uma bandeira tremulante.


Luís Fintelman, vinte de junho de dois mil e treze

Leia meus outros contos na Gazeta do Fintelman.

Um comentário:

  1. http://www.arscives.com/cronicasdoriente/images/brueghel%20os%20cegos.jpg
    imagem que eu sugeriria ao conto.

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